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Comentário - Lei Complementar 147/2014 dispensa CND para baixar empresa, mas atribui a responsabilidade aos sócios pelo cumprimento das obrigações
08/09/2014

Foi publicada recentemente a Lei Complementar 147/2014, que ampliou a aplicabilidade do Simples e dispôs sobre a dispensa da apresentação das certidões negativas de débitos tributários, trabalhistas e previdenciários para a baixa das sociedades.

De acordo com a mencionada legislação, o registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão dos três  âmbitos de governo, ocorrerá independentemente da demonstração da regularidade quanto às obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem. O novo regime, entretanto, atribui ao empresário, aos titulares, aos sócios ou aos administradores a responsabilidade por tais obrigações, sejam elas apuradas antes ou após o ato de extinção.


A lei dispõe expressamente que a solicitação de baixa da pessoa jurídica importa responsabilidade solidária dos empresários, dos titulares, dos sócios e dos administradores no período da ocorrência dos respectivos fatos geradores.


A novidade certamente trará um avanço, pois, além da redução do prazo para se encerrar uma empresa — representando visível progresso diante da burocracia que se vê atualmente —, colabora com a diminuição do número de CNPJ inativos. Todavia, a baixa da sociedade não impede posterior cobrança ou lançamento de tributos e penas contra seus sócios ou administradores, decorrentes tanto das obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas em si quanto da falta do seu cumprimento, bem como da prática comprovada e apurada em processo administrativo ou judicial de outras irregularidades praticadas pelos empresários, pelas pessoas jurídicas ou por seus titulares, sócios ou administradores.


Quanto aos credores, entende-se que a medida não lhes causará nenhum prejuízo, já que o Fisco poderá executar e inscrever os sócios na dívida ativa, conferindo fundamento objetivo à responsabilização dos sócios, o que vem a dirimir a litigiosidade que hoje predomina quando da aplicação das hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica para cobrança de débitos tributários da pessoa jurídica. 


No que toca à atividade empresarial, observa-se que a medida possibilita ao empresário uma nova chance, na hipótese de um empreendimento mal sucedido, para que possa obter êxito em um novo negócio, paralelamente ao pagamento de antigos credores.


A desburocratização vem, ao implicar a responsabilidade por débitos fiscais, conferir lastro a prática que já é amplamente adotada pelo Fisco, que busca sócios e administradores para recuperação dos créditos, aplicando a desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal. Contudo, a jurisprudência pátria atualmente diverge quanto à responsabilização dos administradores, a depender da hipótese apresentada:

 

Desconsideração da personalidade jurídica - Jurisprudência

Hipótese

Posicionamento

Julgado

Mero inadimplemento

De acordo com jurisprudência consolidada do STJ, não há responsabilização dos sócios.

A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.101.728⁄SP, sob o rito dos recursos repetitivos, consolidou entendimento segundo o qual o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da empresa, independentemente da natureza do débito, é cabível apenas quando demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto, ou no caso de dissolução irregular da empresa, não se incluindo o simples inadimplemento de obrigações tributárias.

Dissolução irregular

A dissolução irregular da empresa enseja o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente, nos termos da Súmula 435, do STJ, desde que conste o nome do sócio da empresa na CDA como corresponsável pela dívida tributária.

“Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente." (Súmula 435, do STJ)

Desvio de finalidade/ confusão patrimonial

Nos termos do art. 50, do Código Civil, em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, poderá o Juiz desconsiderar a personalidade jurídica, estendendo os efeitos de determinadas relações de obrigações aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

“Do encerramento irregular da empresa presume-se o abuso da personalidade jurídica, seja pelo desvio de finalidade, seja pela confusão patrimonial, apto a embasar o deferimento da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, para se buscar o patrimônio individual de seu sócio.” (REsp 1259066/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 28/06/2012).

Excesso de poderes ou infração de lei

É devida a responsabilização dos sócios, quando comprovada sua responsabilidade, à época do fato gerador do débito exequendo, decorrente de excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, conforme dispõe o art. 135 do CTN

“É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa.” (EREsp 374.139/RS, 1ª Seção, DJ de 28.02.2005).

 Com a edição da LC 147/2014, a responsabilização dos sócios pelas obrigações da empresa, caso ela possua débitos na ocasião da sua baixa, ocorrerá de forma automática, tendo em vista que a solicitação de baixa do empresário ou da pessoa jurídica importa responsabilidade solidária dos empresários, dos titulares, dos sócios e dos administradores no período da ocorrência dos respectivos fatos geradores.