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Comentário – A antecipação da doação como solução ante a perspectiva de majoração na tributação sucessória
24/03/2015

Em meio à crise que tem impregnado a agenda nacional no período pós-eleitoral, é tendência recorrente, na pauta de propostas voltadas para a implementação do ajuste fiscal, o incremento da taxação do chamado “andar de cima”, como forma de viabilizar politicamente o pacote de aperto monetário e fiscal, angariando apoio da população, hoje majoritariamente refratária às ações do governo.


Das medidas que têm sido cogitadas, a tributação sobre heranças e doações é a considerada a mais plausível, sendo inclusive objeto de recente discussão entre o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.


A proposta é adequar ao cenário brasileiro modelo já vigente em países desenvolvidos, com a criação de um imposto federal para taxação da renda dos contribuintes obtida por meio de doações, heranças e outros tipos de transferências via sucessão, que não envolvam a venda de ativos. O objetivo é ampliar a base de tributação no País e atingir contribuintes com renda mais elevada, dividindo com eles o ônus dos ajustes recentemente implementados pelo Governo Federal, que incluíram reduções de benefícios trabalhistas e previdenciários. Vale a ressalva de que a aprovação de uma medida como esta exigirá mudança na Constituição Federal, por meio de emenda constitucional.


Atualmente, a Constituição Federal atribui aos Estados e Distrito Federal a competência para instituir tributo sobre heranças e doações, o denominado Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITD ou ITCMD). O referido tributo incide quando há transferência de recursos ou patrimônio por herança, ou ainda, quando há doação de dinheiro ou outros bens.


Nos termos da legislação civilista, a transmissão causa mortis se dá no momento da abertura da sucessão. No caso de doação de bens imóveis, a transmissão ocorre com o registro no cartório de imóveis; já a transmissão de bens móveis ocorre com a tradição da coisa. 


O Estado da Bahia estabelece prazo para o recolhimento do imposto: conforme previsão do Decreto nº 2.487/1989, nas transmissões por instrumento público entre vivos sujeitas ao ITD o imposto será pago antes da lavratura do ato ou contrato; nas demais hipóteses, o prazo será de trinta dias contados: (i) da lavratura do instrumento particular da transmissão sujeita ao ITD; (ii) nos casos de arrecadação do imposto em processo judicial, da publicação da sentença que julgue os cálculos, ou da publicação de decisão judicial que determine o recolhimento do imposto em arrolamentos, separações judiciais, divórcios, partilhas, e demais processos; (iii) da data em que se tornar imutável, na via administrativa, a decisão que julgar a impugnação ou recurso; (iv) antes da tradição nas transmissões verbais por ato entre vivos sujeitas ao imposto. Os referidos prazos vencerão sempre antes da tradição ou do registro no Cartório de Imóveis competente, ainda que isso ocorra antes de expirados.


As alíquotas do ITD são estabelecidas pela lei estadual, sendo de competência do Senado fixar as alíquotas máximas, que estão, hoje, no patamar de 8%.


Além disso, autoriza-se a progressividade das alíquotas sobre transmissão causa mortis, com base no valor do quinhão, legado ou bens doados a cada um dos beneficiários, com vistas a adequar o tributo à capacidade econômica de cada um, segundo o princípio da capacidade contributiva; ou seja, quanto maior a herança ou legado, maior a alíquota aplicável.


No Estado da Bahia, por exemplo, a alíquota do ITD na transferência de patrimônio por morte (sucessão hereditária) é de 4%, quando o valor dos bens estiver compreendido na faixa entre R$ 100 mil e R$ 200 mil; de 6%, quando este valor estiver entre R$ 200 mil e R$ 300 mil; e 8%, para valores acima de R$ 300 mil. Na transferência de patrimônio em razão de doação pura e simples a alíquota é de 3,5%, independentemente do valor do bem. Neste caso, portanto, alíquota do imposto é mais baixa.


Desde a Constituição de 1934, momento em que foi instituído, o ITD sempre pertenceu aos Estados, de modo que a tributação das heranças no Brasil nunca foi atribuída à União. Sendo, como é, na Constituição atualmente em vigor, tributo concedido aos Estados-membros e Distrito Federal, tem-se que, para que o governo possa incrementar a tributação sobre a sucessão causa mortis, instituindo um imposto próprio sobre as heranças e legados, será necessário alterar a Constituição Federal de 1988, para redefinir a distribuição de competência tributária efetuada pelo constituinte.


Neste contexto, deve-se registrar que a repartição de competências tributárias integra o Pacto Federativo, na sua dimensão fiscal e financeira, ou seja, o arranjo constitucional de repartição de poderes e competências entre União e Estados-membros, o que, nos termos do art. 60, §4º, I, da Constituição Federal, é cláusula pétrea, impassível de modificação mesmo por ementa constitucional. Dessa forma, uma emenda desse tipo poderia ser considerada inconstitucional, abrindo a possibilidade, em tese, de discussão judicial contra eventual cobrança que venha a ser instituída nos moldes cogitados.


Considerando, conduto, os riscos e o grau de imprevisibilidade de uma discussão desse nível nos nossos tribunais, a perspectiva do aumento na tributação sobre doação e herança torna recomendável aos contribuintes elidir a sua incidência mediante a transferência dos bens antes da edição da nova legislação. Gestores de patrimônio recomendam aos investidores estabelecer um fundo exclusivo fechado, que corresponde a uma carteira montada para um único cliente , sem cobrança de “come-cotas” (tributação semestral que incide sobre fundos multimercados e de renda fixa). O passo seguinte é transmitir cotas aos herdeiros com cláusula de usufruto, garantindo aos doadores a totalidade da renda gerada pelo patrimônio enquanto estiverem vivos. A desvantagem é que a família só pode retirar recursos a cada doze meses.


Utilizando-se de um planejamento sucessório bem elaborado, portanto, o contribuinte poderá antecipar a doação e aproveitar as alíquotas atuais e mais favoráveis de ITD. 

Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITD ou ITCMD)

 

Previsão Constitucional

Art. 155, I, da CFRB/88

 

Fato gerador

         Transmissão por causa mortis (herança) ou por doação, de quaisquer bens ou direitos;

 

 

 

Momento da transmissão (ocorrência do fato gerador)

Causa Mortis

Doação

Abertura da sucessão

Bens móveis

Bens imóveis

Tradição

Registro no cartório de imóveis

Previsão legal

Art. 1.784 do CC

Art. 541, parágrafo único

Art. 1.245, do CC

 

Prazo para recolhimento

Nas transmissões por instrumento público entre vivos sujeitas ao ITD o imposto será pago antes da lavratura do ato ou contrato

Nas demais hipóteses o prazo será de 30 (trinta) dias contados:

a) da lavratura do instrumento particular da transmissão sujeita ao ITD;

b) nos casos de arrecadação do imposto em processo judicial, da publicação da sentença que julgue os cálculos, ou da publicação de decisão judicial que determine o recolhimento do imposto em arrolamentos, separações judiciais, divórcios, partilhas, e demais processos;

c) da data em que se tornar imutável, na via administrativa, a decisão que julgar a impugnação ou recurso;

d) antes da tradição nas transmissões verbais por ato entre vivos sujeitas ao imposto.

Os prazos previstos neste artigo vencerão sempre antes da tradição ou do registro no Cartório de Imóveis competente, ainda que isso ocorra antes de expirado os referidos prazos.

Previsão legal

Arts. 39 e 40, do  Decreto n° 2.487/1989

 

Alíquotas

Estabelecidas pela lei estadual

O Senado Federal fixa as alíquotas máximas, que estão atualmente no patamar de 8%

 

Bahia

Previsão legal

Lei n° 4.826/89

 

Doação

Alíquota

Valor

3,50%

doações de quaisquer bens ou direitos;

 

Transmissões causa mortis

Alíquota

Valor do espólio

4%

de R$100.000,00 (cem mil reais) a até R$200.000,00 (duzentos mil reais)

6%

acima de R$200.000,00 (duzentos mil reais) a até R$300.000,00 (trezentos mil reais)

8%

acima de R$300.000,00 (trezentos mil reais)

 

Recomendação aos contribuintes, com o provável aumento na tributação sobre doação e herança

Doação dos recursos com antecedência