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Comentário - Assinatura de Protocolo Adicional à Convenção entre Brasil e Coreia do Sul confirma tendência de ampliação dos instrumentos internacionais de intercâmbio de informações tributárias entre os países
05/05/2015

Em 24 de abril último, foi assinado o Protocolo Adicional à Convenção Destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre a Renda, celebrada entre Brasil e Coréia do Sul em 1989. O objetivo dessa medida é ampliar o alcance do artigo sobre troca de informações entre as Administrações Tributárias dos países signatários, permitindo-lhes maior acesso a informações referentes a rendimentos e ganhos sujeitos ao imposto de renda em seus territórios, no intuito de combater a fraude, a evasão fiscal, o planejamento tributário abusivo e servindo de forte instrumento na luta contra a lavagem de dinheiro e o crime organizado.


Como seu próprio nome indica, o propósito principal de um acordo desse gênero é eliminar a dupla tributação, de forma a facilitar o comércio internacional e o fluxo de investimentos entre os países, bem como promover a cooperação internacional para facilitar a troca de informações entre as administrações tributárias.


O Modelo de Convenção da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que padroniza a cooperação internacional sobre o tema, já previa a troca de informações em matéria tributária desde 1963, ganhando maior notoriedade com a publicação de Relatório da OCDE em 1998. Em seu artigo 26, trata expressamente do fornecimento de informações entre autoridades fiscais dos Estados contratantes, de forma a permitir o acesso a informações do contribuinte no exterior, tendo em vista que o direito internacional não permite que autoridades fiscais de um país investiguem contribuintes em território de outro país, em respeito à soberania territorial.


Em virtude da crescente pressão da organização e do G-20 para aumentar e/ou evitar a perda de arrecadação tributária dos países desenvolvidos, a matéria é ainda objeto de acordos específicos pactuados entre os países, também denominados de Acordos de Troca de Informações em Matéria Tributária ou Tax Information Exchange Agreements (TIEAs).


Pode-se dizer, portanto, que há dois tipos de dispositivos prevendo a efetiva troca de informações em matéria tributária entre os países: o artigo 26 do Modelo de Convenção da OCDE para Evitar a Dupla Tributação (seguido pelos Modelos da ONU e dos EUA); e os Acordos de Troca de Informações em Matéria Tributária (TIEAs).


A troca de informações, nos termos do Modelo de Convenção da OCDE, abrange impostos de todos os tipos, cobrados pelos Estados (ou subdivisões políticas e autoridades locais).  Além disso, os dados devem ser considerados “previsivelmente relevantes” para a aplicação da convenção ou da legislação interna dos Estados - e não “necessários”, em absoluto -, o que amplia a gama de dados passíveis de serem fornecidos, aplicando-se inclusive a não-residentes. A obrigação de trocar informações é aplicável ainda que o Estado requerido não precise dos referidos dados para fins de sua própria tributação. Desse modo, os Estados podem utilizar seus mecanismos internos de coleta de dados apenas para obter e fornecer informações para os demais Estados.


Em relação às formas de troca de informações, o aludido Modelo prevê três diferentes modalidades: (i) a requerimento de um Estado, referentes a uma pessoa ou a uma transação determinada; (ii) automática, relativamente a determinada categoria de casos; e (iii) espontânea, quando supostamente do interesse do outro Estado, em transações suspeitas ou aparentemente fictícias. Os Estados podem, inclusive, adotar qualquer outra forma de troca de informações que lhes pareça pertinente.


A troca de informações fiscais entre os Estados contratantes, no entanto, não é ilimitada. Devem ser observadas algumas restrições, dentre elas a confidencialidade das informações recebidas, à qual estão sujeitas as administrações fiscais. Segundo essa condição, a troca de informações somente pode ocorrer quando o Estado requerente se comprometer a tratar os dados recebidos como sigilosos, do mesmo modo que tratariam se tivessem sido obtidos de acordo com as leis internas do Estado requerido. Os dados podem, no entanto, ser revelados a pessoas e autoridades (incluindo cortes e órgãos administrativos) envolvidas na autuação, arrecadação, aplicação ou investigação tributária.


Ademais, um Estado não é obrigado a ir além do permitido pela sua legislação interna ou pela sua prática administrativa para obter e, consequentemente, fornecer informações a outro Estado, podendo se recusar a fornecer informações quando vedada sua obtenção pelo Estado requerente, em razão de dispositivo legal ou da prática administrativa daquele Estado, ou não fornecer informações que impliquem na divulgação de segredos comerciais, negociais ou industriais, bem como de informações que sejam contrárias ao interesse público. Essas restrições, contudo, não podem obstar a troca de informações detidas por instituições financeiras, bem como a troca de determinadas informações societárias. Em outras palavras, é permitida a troca de informações relativas à participação acionária e informações bancárias.


Conforme mencionado, embora a troca de informações já esteja abarcada pelas Convenções para Evitar a Dupla Tributação, tem-se observado, nos últimos anos, um aumento expressivo de outra modalidade de Convenção, objetivando exclusivamente a troca de informações em matéria tributária: os Acordos de Troca de Informações em Matéria Tributária (TIEAs), desenvolvidos a partir de estudos efetuados pelo Grupo de Trabalho do Fórum Global da OCDE sobre a efetiva troca de informações, com o propósito de combater as práticas tributárias prejudiciais efetuadas por paraísos fiscais.


Trata-se de alternativa ao artigo 26 da Convenção Modelo da OCDE, já que muitos países não estariam dispostos a celebrar Acordos para Evitar Dupla Tributação com “paraísos fiscais”, mas pretendem obter informações fiscais relativas a contribuintes que possuam negócios ou estejam neles estabelecidos, de modo que a assinatura de tais acordos com países considerados “paraísos fiscais” é fenômeno bastante frequente e difundido.


O Modelo de Acordo para Troca de Informações em Matéria Tributária pode ser feito de forma multilateral ou bilateral, e tem como objetivo promover a cooperação internacional através da troca de informações entre os países, para uma melhor implementação e aplicação da legislação tributária interna. Vale a ressalva de que, embora tenha sido esta a proposta inicial para a elaboração e disseminação do modelo TIEA, não há qualquer impedimento à sua celebração entre países que não sejam considerados “paraísos fiscais”: isso pode ocorrer quando os países contratantes não possuam entre si uma Convenção para Evitar a Dupla Tributação ou quando a Convenção existente não estiver em consonância com o padrão internacional de troca de informações estabelecido pela OCDE.


De maneira geral, a forma utilizada pelo Acordo para a Troca de Informações é o requerimento. Ao efetuar o pedido de informações, o Estado requerente deve fornecer uma lista das informações de que necessita, demonstrando assim a “relevância previsível” das informações solicitadas. Nestas circunstâncias, as autoridades competentes do Estado requerido ficam obrigadas a fornecer, dentro dos limites do acordo, as informações solicitadas, a exemplo de informações obtidas junto a instituições financeiras e relacionadas à composição acionária, inclusive de todo o grupo societário do contribuinte objeto da apuração. Um Estado pode ainda permitir que representantes do outro Estado entrem em seu território para interrogar pessoas e examinar livros e documentos fiscais de contribuintes sob investigação. Observe-se que, nessa modalidade, também existem restrições à troca de informações em matéria tributária, bastante semelhantes à Convenção Modelo da OCDE.


Assim como a maioria dos países, o Brasil segue a estrutura e o conteúdo do Modelo de Convenção da OCDE, alterando, por vezes, os seus dispositivos, de acordo com a sua conveniência. Atualmente, o país conta com 31 (trinta e uma) Convenções para Evitar a Dupla Tributação em vigor[1], sendo que todas possuem cláusula prevendo “a troca de informações”.


Quanto a Acordos para Troca de Informações Tributárias (ou TIEA), o Brasil só possui um em vigor atualmente, pactuado com os Estados Unidos. O referido acordo foi assinado em março de 2007, sendo ampliado em setembro/2014 para atender aos requisitos previstos pela “Foreign Account Tax Compliance Act – FATCA”, lei norte-americana que objetiva identificar atividades financeiras de contribuintes norte-americanos no exterior. O acordo prevê que informações sobre contribuintes norte-americanos no Brasil sejam encaminhadas pelas instituições financeiras para a Secretaria da Receita Federal brasileira e posteriormente repassadas por esta ao “Internal Revenue Service – IRS” dos EUA. Em contrapartida, a Receita Federal receberá das autoridades tributárias norte-americanas informações sobre movimentações financeiras de contribuintes brasileiros em instituições financeiras dos EUA.


Quanto ao Protocolo Adicional à Convenção Destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre a Renda, recentemente pactuado por Brasil e Coreia do Sul, ressalte-se que o documento estabelece regras quanto à proteção do sigilo das informações fornecidas e recebidas, seguindo os padrões internacionais e recomendações do Fórum Global sobre Transparência e Troca de Informações para Fins Tributários.



[1] Conforme site da Receita Federal do Brasil http://www.receita.fazenda.gov.br e portal sobre troca de informações da OCDE http://www.eoi-tax.org, o Brasil possui Convenções para Evitar a Dupla Tributação com os seguintes países: África do Sul, Argentina, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, China, Coreia do Sul, Dinamarca, Equador, Eslováquia e República Tcheca, Espanha, Filipinas, Finlândia, França, Hungria, Índia, Israel, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Países Baixos, Peru, Portugal, , Suécia, Trinidad e Tobago, Turquia, Ucrânia e Venezuela.

Acordos de trocas de informações tributárias

 

Modelo

Objetivo

Acordos firmados pelo Brasil

Modelo de Convenção da OCDE

Eliminar a dupla tributação, de forma a facilitar o comércio internacional e o fluxo de investimentos entre os países, bem como promover a cooperação internacional para facilitar a troca de informações entre as administrações tributárias.

África do Sul, Argentina, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, China, Coreia do Sul, Dinamarca, Equador, Eslováquia e República Tcheca, Espanha, Filipinas, Finlândia, França, Hungria, Índia, Israel, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Países Baixos, Peru, Portugal, , Suécia, Trinidad e Tobago, Turquia, Ucrânia e Venezuela

Acordos de Troca de Informações em Matéria Tributária ou Tax Information Exchange Agreements (TIEAs)

Desenvolvidos a partir de estudos efetuados pelo Grupo de Trabalho do Fórum Global da OCDE sobre a efetiva troca de informações, com o propósito de combater as práticas tributárias prejudiciais efetuadas por paraísos fiscais. Trata-se de alternativa ao artigo 26 da Convenção Modelo da OCDE, já que muitos países não estariam dispostos a celebrar Acordos para Evitar Dupla Tributação com “paraísos fiscais”, mas pretendem obter informações fiscais relativas a contribuintes que possuam negócios ou estejam neles estabelecidos.

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