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Receita Federal publica portaria que prevê cobrança prioritária de devedores com passivo superior a R$10.000.000,00
17/09/2015

A Receita Federal (“RFB”) publicou, no último dia 05, uma portaria que regulamenta a Cobrança Administrativa Especial, referente a débitos tributários que estejam na condição de exigíveis e cujo somatório, por sujeito passivo, seja igual ou superior a R$ 10.000.000,00.

 

A cobrança administrativa especial regulamentada pela Portaria RFB nº 1265/2015 (“Portaria”) pode ser definida como aquela realizada de forma prioritária e que abrange débitos tributários que não sejam mais passíveis de recurso na esfera administrativa, sendo que a soma dos débitos, por sujeito passivo, deve ser a partir de R$ 10.000.000,00 para a efetivação da medida. 

 

Segundo o texto normativo, o objetivo da cobrança especial é “aprimorar os procedimentos de recuperação de créditos tributários (CT) e, consequentemente, promover o aumento e a sustentação da arrecadação dos tributos federais.” Na prática, contudo, a norma enumera uma série de sanções a serem desferidas contra o contribuinte que acumule um passivo tributário exigível, perante a Receita Federal, em valor superior a R$10 milhões.

 

É certo que a quase totalidade das punições já está prevista em legislações esparsas e poderia ser aplicada independentemente da criação da Portaria nº RFB nº 1265/2015. Não está claro, contudo, se a Receita Federal, na aplicação das sanções listadas na Portaria, irá observar os requisitos previstos nas leis respectivas, que regulam cada punição, ou sujeitará o contribuinte às severas restrições de direitos e multas pelo simples fato de que o passivo fiscal supere a marca dos R$10 milhões.  A considerar-se esta última hipótese, o sujeito passivo, uma vez intimado, caso não regularize seus débitos perante a Receita Federal, estará sujeito a rigorosas penalidades. A Portaria nº 1265/2015 prevê vinte e cinco sanções, sendo que muitas delas podem ser consideradas demasiado severas e até mesmo desproporcionais, considerando o atual contexto econômico do país, em que as empresas estão sofrendo com inflação, juros altos e necessidade de cortes em seus orçamentos.

 

A primeira penalidade prevista no diploma normativo é o encaminhamento dos dados do contribuinte ao Cadin, o que o impedirá de realizar operações de crédito, a concessão de incentivos fiscais e financeiros e a celebração de convênios, acordos ou quaisquer ajustes que envolvam desembolso de recursos públicos.

 

A portaria prevê também a exclusão do sujeito passivo de programas especiais de parcelamento dos quais faça parte (Refis, Paes e Paex). A justificativa dada pela Receita é a de que essa possibilidade está amparada nas leis instituidoras dos programas, que obriga os sujeitos passivos que dele façam parte à adimplência de tributos com vencimento posterior à sua adesão.

 

No caso de Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, também poderão ser excluídas do Simples Nacional em caso de não regularização dos débitos abrangidos pela cobrança administrativa especial, em atendimento aos ditames do art. 17, V, da Lei Complementar nº 123/2006.

 

Uma das medidas mais criticadas, no entanto, é a propositura de Representação Fiscal para Fins Penais junto ao Ministério Público Federal, tendo em vista que somente pode ser estabelecida uma sanção criminal quando há características de dolo ou fraude. Diante desse quadro, muitas empresas podem discutir essa penalidade, acaso aplicada, no Judiciário.

 

Dentre tantas outras penalidades, há previsão de comunicação às respectivas Agências Reguladoras para que seja revogada a autorização para o exercício da atividade, no caso de sujeito passivo detentor de Concessões e Permissões da Prestação de Serviços Públicos, tendo em vista a ausência de regularidade fiscal para com a União. A proporcionalidade da medida pode ser discutida utilizando-se por argumento a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal, editada através da Súmula nº 70, segundo a qual é “inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para a cobrança de tributo.” Observa-se, ainda, um confronto direto com a função social da empresa e com os danos que a interrupção das suas atividades pode ocasionar à comunidade e à economia como um todo (considerando os empregos ofertados e os ganhos econômicos que a sua manutenção oferecem).

 

Além das medidas expressamente previstas na Portaria, há ainda um permissivo para a adoção de  outros procedimentos pela RFB, inclusive a inserção do sujeito passivo e, no caso de pessoa jurídica, dos respectivos sócios e responsáveis em programa especial de fiscalização, enfatizando-se que os procedimentos da Cobrança Administrativa Especial deverão também ser aplicados aos sócios que responderem solidariamente pela dívida.

 

Quanto ao prazo, prevê o diploma que os procedimentos da cobrança especial deverão ser realizados no prazo máximo de 06 (seis) meses, contado da inclusão do débito tributário em Cobrança Administrativa Especial. Aqueles não regularizados deverão ser encaminhados à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para fins de inscrição em Dívida Ativa da União.

 

Diante do exposto, recomenda-se ao contribuinte que detém passivo fiscal na esfera federal em valores próximos ou superiores a R$10 milhões que monitorem o seu estado de adimplência fiscal, seus pleitos, processos e fiscalizações em curso perante a Receita Federal, sendo que, na hipótese de vir a ser sujeito à cobrança administrativa especial instituída pela Portaria RFB nº 1265/2015, submeter à avaliação do seu advogado a atuação dos órgãos fiscalizadores, quanto à observância dos requisitos legais e mesmo da proporcionalidade das medidas aplicadas, tendo em vista a  possibilidade de acionar vias judiciais e a proteção dos seus interesses e direitos perante o Poder Judiciário.

   

Quadro-resumo: Portaria RFB 1265/2015

 

Cobrança Administrativa Especial - Características

Previsão: art. 1º

(i) realizada de forma prioritária

(ii) abrange, obrigatoriamente, os CT que estejam na condição de exigíveis, cujo somatório, por sujeito passivo, seja igual ou maior que R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais)

 

Objetivos

Previsão: art. 1º

Aprimorar os procedimentos de recuperação de créditos tributários (CT) e, consequentemente, promover o aumento e a sustentação da arrecadação dos tributos federais.

 

Medidas aplicadas ao sujeito passivo que, intimado, não regularizar os créditos tributários abrangidos pela Cobrança Administrativa Especial

Previsão: art. 2º

I - encaminhamento dos dados do sujeito passivo para inclusão no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público Federal (Cadin), o que inviabilizará a realização de operações de crédito que envolvam a utilização de recursos públicos, a concessão de incentivos fiscais e financeiros e a celebração de convênios, acordos, ajustes ou contratos que envolvam desembolso, a qualquer título, de recursos públicos, e respectivos aditamentos, por órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta, de acordo com o disposto no art. 6º da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002;

II - exclusão do sujeito passivo do Programa de Recuperação Fiscal (Refis), ou do parcelamento a ele alternativo, estabelecidos pela Lei nº 9.964, de 10 de abril de 2000, com exigibilidade imediata da totalidade do crédito confessado e ainda não pago, bem como automática execução da garantia prestada, quando existente, restabelecendo-se, em relação ao montante não pago, os acréscimos legais na forma da legislação aplicável à época da ocorrência dos respectivos fatos geradores, conforme definido por aquele ato legal;

III - exclusão do sujeito passivo do Parcelamento Especial (Paes), instituído pela Lei nº 10.684, de 30 de maio de 2003, com exigibilidade imediata da totalidade do crédito confessado e ainda não pago, restabelecendo-se, em relação ao montante não pago, os acréscimos legais na forma da legislação aplicável à época da ocorrência dos respectivos fatos geradores, conforme definido por aquele ato legal;

IV - exclusão do sujeito passivo do Parcelamento Excepcional (Paex), instituído pela Medida Provisória nº 303, de 29 de junho de 2006, com exigibilidade imediata da totalidade do crédito confessado e ainda não pago, restabelecendo-se, em relação ao montante não pago, os acréscimos legais na forma da legislação aplicável à época da ocorrência dos respectivos fatos geradores, conforme definido por aquele ato legal;

V - exclusão do sujeito passivo do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), por infração ao inciso V do art. 17 da Lei Complementar nº 123, 14 de dezembro de 2006;

VI - encaminhamento ao Ministério Público Federal de Representação Fiscal para Fins Penais, relativa ao débito em questão, conforme estabelecido no art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996;

VII - propositura de Representação Fiscal para Fins Penais junto ao Ministério Público Federal por deixar de recolher aos cofres públicos, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social retidos, conforme inciso II do art. 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, caso os débitos objeto da Cobrança Administrativa Especial sejam dessa natureza;

VIII - aplicação de multa à empresa e a seus diretores e demais membros da administração superior, na hipótese de irregular distribuição de bônus e lucros a acionistas, sócios, quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos, pela inobservância do disposto no art. 32 da Lei nº4.357, de 16 de julho de 1964;

IX - arrolamento de bens e direitos para acompanhamento do patrimônio do sujeito passivo, com base no disposto nos arts. 64 e 64-A da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997;

X - representação aos Departamentos de Trânsito (Detran), às Capitanias de Portos e Tribunal Marítimo e ao Departamento de Aviação Civil para que seja exigida Certidão Negativa de Débitos (CND) quando da alienação ou oneração a qualquer título, de bem móvel de valor superior ao definido pelo Poder Executivo, conforme previsto na alínea c do inciso I do art. 47 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991;

XI - comunicação às respectivas Agências Reguladoras para que seja revogada a autorização para o exercício da atividade, no caso de sujeito passivo detentor de Concessões e Permissões da Prestação de Serviços Públicos, tendo em vista a ausência de regularidade fiscal para com a União, em conformidade com o disposto no inciso IV do art. 27, no inciso IV do art. 29 e no inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, c/c o art. 14, o inciso VII do § 1ºdo art. 38 e o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995;

XII - representação aos bancos públicos para fins de não liberação de créditos oriundos de fundos públicos, repasses e financiamentos, inclusive de parcelas de financiamentos ainda não liberadas, tendo em vista o disposto no art. 6º da Lei nº 10.522, de 2002;

XIII - representação ao órgão competente da administração pública federal direta ou indireta, para fins de rescisão de contrato celebrado com o Poder Público, tendo em vista a ausência de regularidade fiscal para com a União, em conformidade com o disposto no inciso IV do art. 27, no inciso IV do art. 29 e no inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666, de 1993;

XIV - exclusão de benefícios e/ou incentivos fiscais, relativos a tributos administrados pela RFB, inclusive os vinculados ao Comércio Exterior, tendo em vista a ausência de regularidade fiscal para com a União, com base no disposto no art. 60 da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995;

XV – cancelamento da habilitação ao Despacho Aduaneiro Expresso (Linha Azul) e da certificação ao Programa Brasileiro de Operador Econômico Autorizado, tendo em vista a ausência de regularidade fiscal para com a União, conforme previsto no inciso I do art. 3º da IN RFB nº 476, de 13 de dezembro de 2004, e no inciso IV do art. 8º da IN RFB nº 1521, de 4 de dezembro de 2014;

XVI – representação à Administração Pública Estadual ou Municipal para fins de rescisão de contrato ou exclusão de benefício e/ou incentivos fiscais ou creditícios, na hipótese da existência de débitos relativos a tributos destinados à seguridade social, nos termos do § 3º do art. 195 da Constituição Federal, bem como na alínea “a” do inciso I do art. 47 da Lei nº 8.212, de 1991;

XVII - bloqueio do Fundo de Participação do Distrito Federal, do Estado ou do Município, de acordo com o disposto no inciso I do parágrafo único do art. 160 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal;

XVIII - representação para interposição de medida cautelar fiscal, caso o sujeito passivo se enquadre em uma das hipóteses previstas no art. 2º da Lei nº 8.397, de 6 de janeiro de 1992, e no art. 15 da Instrução Normativa RFB nº 1.565, de 11 de maio de 2015;

XIX - lançamento de ofício de multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do pagamento mensal do tributo determinado sobre base de cálculo estimada, que deixou de ser efetuado, ainda que tenha sido apurado prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa para a contribuição social sobre o lucro líquido, no ano-calendário correspondente, nos termos da alínea ′b′ do inciso II do art. 44 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996;

XX – declaração de inaptidão da pessoa jurídica caracterizada como “não localizada” pela não confirmação do recebimento de 2 (duas) ou mais correspondências enviadas pela Cobrança Administrativa Especial, ou por diligência, com encaminhamento de carta aos sócios para ciência da declaração de inaptidão, nos termos art. 39 da Instrução Normativa RFB nº 1.470, de 2014;

XXI - suspensão da inscrição no Cadastro da Pessoa Física (CPF), no caso de não recebimento das correspondências enviadas pela Cobrança Administrativa Especial devido a inconsistências cadastrais, nos termos do art. 12 da Instrução Normativa RFB nº 1.548, de 13 de fevereiro de 2015;

XXII - revogação da moratória nos termos do inciso I do art. 8º da Lei nº 12.688, de 18 de julho de 2012, no caso de entidades mantenedoras de instituições de ensino superior integrantes do sistema de ensino federal que aderiram ao Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies);

XXIII - revogação da moratória e da remissão de débitos nos termos do art. 37 da Lei nº 12.873, de 24 de outubro de 2013, no caso de entidades que aderiram ao Programa de fortalecimento das entidades privadas filantrópicas e das entidades sem fins lucrativos que atuam na área da saúde e que participam de forma complementar do Sistema Único de Saúde (Prosus);

XXIV - exclusão do parcelamento e do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), nos termos do art. 4º da Lei nº 13.155, de 4 de agosto de 2015, ficando a entidade proibida de usufruir de incentivo ou benefício fiscal previsto na legislação federal ou de receber repasses de recursos públicos federais da administração direta ou indireta pelo prazo de 2 (dois) anos, contado da data da rescisão, no caso das entidades desportivas profissionais de futebol que aderiram ao Programa; e

XXV - encaminhamento do débito para inscrição em Dívida Ativa da União (DAU), sobre o qual incidirá 20% (vinte por cento) de encargos sobre o montante total do débito, além dos demais acréscimos legais, bem como ajuizamento de execução fiscal, com penhora ou arresto de bens, conforme estabelecido pelo Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e pela Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980.