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Decisão do STF fixa precedente para ressarcimento do ICMS cobrado via substituição tributária
04/11/2016

O Supremo Tribunal Federal decidiu no último dia 19 de outubro que o ICMS cobrado antecipadamente via substituição tributária (ICMS ST) deve ser ressarcido pelo Fisco quando o fato gerador real realizar-se em valor menor do que o fato gerador presumido. O entendimento, firmado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 539.849/MG, fixa precedente valioso para que os contribuintes pleiteiem em ações individuais o direito ao ressarcimento daqui em diante em seus respectivos Estados. Na mesma ocasião, foram julgadas pelo tribunal as Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.º 2777/SP e nº 2675/PE, nas quais foi negado o pleito dos Estados para reconhecer a inconstitucionalidade das normas de São Paulo e de Pernambuco  que concediam aos contribuintes o direito ao ressarcimento do ICMS ST.

A cobrança do ICMS ST é técnica tributária de intensa disseminação nas últimas décadas, pela qual o Fisco centraliza nos primeiros elos da cadeia de circulação da mercadoria, a exemplo do importador ou distribuidor, a cobrança do imposto devido na venda para o consumidor final, antecipando a cobrança e concentrando o controle de arrecadação em poucos agentes econômicos de grande porte. Para viabilizar a antecipação da cobrança do ICMS ST, ou seja, a sua arrecadação antes da ocorrência da operação final que está sendo tributada, a legislação traz critérios de cálculo do fato gerador presumido, que é resultado do preço de venda praticado pelo remetente da mercadoria acrescido de parcela resultante de margem de valor agregado (MVA) relativa à operação subsequente. 

Apesar de a MVA prevista nas legislações estaduais dever ser fixada a partir de preços sugeridos ou via levantamento de preços médios de mercado, o que garantiria uma aproximação da base de cálculo presumida do preço efetivamente cobrado na operação final de venda ao consumidor final, fato é que em inúmeras circunstâncias a operação real de venda ao consumidor final é realizada em valores inferiores à base presumida utilizada para cobrança do ICMS ST, resultando num valor de imposto superior ao que deveria ser efetivamente recolhido. Ocorre que a maioria dos Estados não restitui a diferença do ICMS recolhido a maior pela ocorrência do fato gerador real em valores menores do que o fato gerador presumido, o que fez surgir a disputa judicial sobre a questão.

O Supremo Tribunal Federal havia se pronunciado sobre essa matéria em 2002 no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.851/AL, tendo entendido naquela ocasião que os Estados não eram obrigados a restituir a diferença de imposto na hipótese em que a operação final for de valor inferior ao do fato gerador presumido. O tribunal havia entendido que o fato gerador presumido é definitivo, de modo que, caso se entendesse que o fato gerador real devesse prevalecer, resultaria em insegurança e complexidade que comprometeriam a praticabilidade que é a razão de serdo regime de ICMS ST.

Levado a apreciar a questão 14 anos depois por ocasião do julgamento do RE nº 539.849, o tribunal alterou o seu entendimento e para tanto considerou não apenas o princípio da capacidade contributiva e a necessidade de tributar o fato gerador efetivo, mas também a evolução dos sistemas de fiscalização tributária utilizados no país, que permitem sem maiores dificuldades identificar o fato gerador real na apuração do ICMS ST e processar o ressarcimento quando devido. A tese firmada pelo STF resultou assim redigida: “É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida". Para evitar um grande número de ações judiciais visando recuperar tributos passados, o tribunal modulou os efeitos da decisão, restringindo a sua aplicabilidade aos casos futuros e aqueles já ajuizados pendentes de julgamento, de modo que os contribuintes que ainda não entraram com a ação não terão direito ao ressarcimento quanto a fatos geradores já ocorridos, mas apenas quanto aos fatos geradores futuros.

A decisão do STF, de 19/10/2016, tendo sido proferida em recurso extraordinário, produz efeitos apenas para as partes do processo; fixa, porém, um precedente que vincula os tribunais inferiores em todo o país. O tribunal declarou a inconstitucionalidade da legislação mineira que restringe o ressarcimento do ICMS ST na hipótese de fato gerador real menor do que o presumido e reconheceu o direito do contribuinte ao creditamento da diferença em sua escrita fiscal. Em princípio, a decisão de inconstitucionalidade proferida pelo STF em recurso extraordinário só tem eficácia para todos (erga omnes) quando editada resolução do Senado Federal. O regime atual de recursos extraordinários repetitivos implica, porém, que o entendimento consagrado no julgamento do RE com repercussão geral reconhecida e proferido sob regime de recurso representativo de controvérsias, como no caso do RE nº 539.849, deve ser aplicado a todos os demais processos que discutam a mesma questão constitucional, ou seja, que tratemda mesma matéria.

O precedente vincula, portanto, apenas o Poder Judiciário na figura, sobretudo, dos tribunais estaduais e juízes de primeira instância, que são obrigados a aplicar o mesmo entendimento nos outros processos sobre a questão. A Administração Tributária, por outro lado, não é obrigada a seguir o posicionamento do STF, de modo que as legislações estaduais e a prática das autoridades fiscais ainda permanecerão rejeitando o ressarcimento do ICMS ST, cabendo a cada contribuinte pleitear individualmente em ação própria o direito ao ressarcimento.

Decisões do Supremo Tribunal Federal sobre Ressarcimento do ICMS ST

 

Processo

Data

Decisão

ADI 1851/AL

08/05/2002

Declarou a constitucionalidade da Cláusula Segunda do Convênio ICMS nº 13/1997, que nega ao contribuinte o direito à restituição do ICMS ST recolhido antecipadamente, quando a operação final ocorrer em valor inferior à operação presumida.

 

RE nº 539.849/MG

19/10/2016

Declarou a inconstitucionalidade dos arts. 22, §10, da Lei nº 6.763/75 e 21 do Decreto nº 43.080/02, ambos do Estado de Minas Gerais, que negavam o direito ao ressarcimento do ICMS ST pago antecipadamente, na hipótese em que a operação final ocorrer em valor inferior à operação presumida. Decretou que "é devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida".

 

ADI 2777/SP

19/10/2016

Foi julgada improcedente a ação que visava declarar a inconstitucionalidade do art. 66-B, II da Lei nº 6.374/89 do Estado de São Paulo, que assegurava ao contribuinte o direito à restituição do ICMS ST pago antecipadamente, na hipótese em que a operação final ocorrer em valor inferior à operação presumida.

 

ADI 2675/PE

19/10/2016

Foi julgada improcedente a ação que visava declarar a inconstitucionalidade do art. 19, II da Lei nº 11.408/96 do Estado de Pernambuco, que assegurava ao contribuinte o direito à restituição do ICMS ST pago antecipadamente, na hipótese em que a operação final ocorrer em valor inferior à operação presumida.