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STF decide que Estado não pode abater débito tributário de RPV24/03/2015
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a
Fazenda Pública não pode abater dívidas tributárias de requisições de pequeno
valor (RPVs). O entendimento contrário à compensação automática foi o mesmo
aplicado ao caso dos precatórios, julgado em março de 2013.
Por unanimidade, os ministros declararam que a prática é
inconstitucional, mesmo que exista previsão legal. Como foi dado em repercussão
geral, o entendimento deve ser seguido pelas instâncias inferiores.
O recurso julgado recentemente é do governo do Distrito Federal.
Por nota, a Procuradoria-Geral do Distrito Federal informou que não vai
recorrer da decisão do Supremo.
As RPVs, por terem valores menores que os precatórios,
possuem procedimentos de pagamentos mais simplificados e rápidos.
Os ministros seguiram voto do relator, ministro Luiz Fux.
“Por que apenas a administração pública, quando devedora, poderá ter seus
débitos compensados com seus créditos? Não há justificativa plausível para
tamanha discriminação. A medida deve valer para credores e devedores públicos e
privados, ou acaba por configurar autêntico privilégio odioso”, disse.
Fux também considerou que a Fazenda Pública dispõe de outros
meios igualmente eficazes para a cobrança de seus créditos, como a execução
fiscal, a penhora e a inclusão de devedores nos cadastros de inadimplentes.
Por unanimidade, os ministros negaram provimento ao recurso
do Distrito Federal. Entenderam que, em relação às RPVs, deve ser aplicado o já
decidido nas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) 4.357 e 4.425,
sobre precatórios, em março de 2013. “O objeto do pedido de compensação, que
nós consideramos inconstitucional em relação aos precatórios, também se aplica,
a fortiori [com muito mais razão], às requisições de pequeno valor”, disse Fux.
Ao julgar as Adins, os ministros derrubaram os parágrafos 9º
e 10º do artigo 100 da Constituição Federal, introduzidos pela Emenda
Constitucional nº 62, de 2009. Entenderam que a sistemática de compensação em
proveito exclusivo da Fazenda Pública fere o princípio da isonomia.
Para o advogado Júlio de Oliveira, do Machado Associados,
embora o julgamento trate especificamente de RPV, essa tese pode ser aplicada a
qualquer caso em que houver uma condenação favorável ao particular e este for
devedor da União, Estado ou município.
O maior problema da compensação automática, segundo
Oliveira, é que a Fazenda Pública pode abater débito que o contribuinte
considera indevido. “Se ainda pode ser contestado e derrubado pela Justiça, o
contribuinte fica numa situação de muita fragilidade”, disse.
De acordo com o advogado, a decisão do Supremo pode ser
usada em mandado de segurança que pede, preventivamente, que a compensação
automática não seja realizada, ou sua reversão urgente.
O advogado João Marcos Colussi, do Mattos Filho Advogados,
também entendeu que o contribuinte pode usar o precedente sobre RPV em qualquer
caso envolvendo Receita Federal, Fazenda estadual ou municipal. “Há as mesmas
violações”, afirmou. Para ele, a interpretação do STF demonstra que o Estado
não tem carta branca para impor a compensação de ofício em qualquer situação.
“Se a Justiça determinar o pagamento de um crédito pelo Fisco, tem que ser
pago, independentemente de débitos em aberto do contribuinte.”
A Instrução Normativa da Receita Federal nº 1.300 prevê que,
nesses casos, a administração tem a obrigação de fazer a compensação de ofício.
“Só se o contribuinte entra em um parcelamento, apresenta garantia do pagamento
do débito ou discute se o valor é devido na esfera administrativa ou judicial é
liberada a restituição”, disse Colussi.
Para o advogado Tércio Chiavassa, do escritório Pinheiro
Neto Advogados, o precedente deverá ser aplicado pelas demais instâncias da
Justiça e em relação a qualquer tipo de valor. “Na prática, a utilização da
compensação de ofício é mais usual pelo Fisco federal, quando existe débito em
aberto na conta corrente do contribuinte”, afirmou o advogado.
Mas como os ministros levaram em consideração as Adins dos
precatórios, Chiavassa pondera que os efeitos desses processos ainda podem ser
modulados (limitados no tempo). E esse fato também pode refletir em outras
discussões. “Mas isso ainda não foi feito e nem se sabe quando e de que forma
acontecerá. Enquanto isso, a decisão é eficaz.”
No processo do Distrito Federal, a Procuradoria-Geral do
Município (PGM) de São Paulo é parte interessada (amicus curiae). Por nota, o
órgão explicou que fez isso em razão da representatividade de seu estoque de
precatórios – sua dívida é uma das maiores do país – “e do impacto que decisões
idênticas terão no cumprimento do sistema constitucional de pagamento de
precatórios”.